quinta-feira, setembro 27, 2007

Microconto XXIV - Estímulo

Sua cor preferida era o violeta. Embora fosse cego, esta lhe soava melhor aos ouvidos.

domingo, setembro 16, 2007

Um Desejo

No meio do bosque havia uma grande pedra, toda coberta de musgo. Em volta dela, árvores altíssimas das quais pendiam cipós e raízes que alcançavam o chão. O sol penetrava com certa diculdade, ainda que fosse meio dia; a penumbra multiplicava sombras e realidades. Ao largo, um homem se aproximava devagar, abrindo espaço por entre arbustos menores, cipós e troncos seculares. Estava exausto.

Sobre a pedra havia um prato de comida cuidadosamente preparada e arrumada, cujo cheiro se espalhava e preenchia todo o bosque. Mas a aproximação se tornava mais difícil a cada passo. Era como se os espinhos se multiplicassem, arranhando suas pernas, como se o mato crescesse ao redor dos seus pés e o terreno fosse se tornando mais movediço. Mas ele continuava firme. Seguia movido por aquele resto de força que geralmente nem sabemos ter, mas que vêm à tona no momento em que a esperança reaparece.

A cansativa jornada provavelmente não passou dos 200 metros, mas pareceu-lhe ter durado um dia inteiro. Quando finalmente alcançou a pedra, levou a comida à boca com ansiedade. Ignorando a presença dos talheres, dos guardanapos de seda, do prato de porcelana chinesa, pegou o bife com a mão e o levou à boca.

Sentiu o sangue lhe reaver as forças e pouco a pouco foi recuperando os sentidos. Tanto que quando estendeu a mão para pegar o resto da comida, não havia mais prato, nem talheres e nem bife, mas os pedaços de um coelho que ele havia de ter estraçalhado segundos antes. Não se deteve.

sexta-feira, setembro 14, 2007

Microconto XXIII - O Ponto Cego

A dúvida não era que caminho escolher, mas se queria seguir.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Microconto XXII - O sono dos justos

Entre tiros e explosões, um cachorro surdo dormia sossegado.

terça-feira, setembro 04, 2007

PARE

Um carro desgovernado atravessou a rua. O sinal estava vermelho. Freios. Buzinas. Pessoas se jogam no chão. Não deu para ver o condutor através do vidro esfumeado, tudo aconteceu muito rápido. O carro sumiu depois da curva. As pessoas foram se levantando, alguns gritando que isto era um absurdo, outras rindo de susto. Os carros parados se puseram outra vez em movimento, os motoristas olhavam estupefatos e recomeçavam devagar.

Ao longe se ouviram as buzinas, os gritos dos outros. Aqui se perguntava se alguém havia anotado a placa. Não. Em poucos segundos, a vida fluia novamente.

Estavam todos com muita pressa para se indignar, e ninguém havia morrido. O carro desgovernado não passou de um incidente num dia comum. Uma pequena quebra na rotina para que os velhos casais tivessem algo que comentar na hora da janta.